sexta-feira, 12 de julho de 2013

RESISTÊNCIA À LEPTINA

         

      Geralmente, os pacientes com excesso de peso apresentam acúmulo de gordura em dois compartimentos diferentes do corpo: a gordura subcutânea (que fica entre os músculos e a pele, portanto em um compartimento mais superficial), e a gordura visceral (que fica dentro do tronco, internamente à camada muscular, em contato íntimo com o fígado e com os órgãos abdominais, sendo portanto uma gordura mais profunda). Sabemos hoje que o tecido adiposo é na verdade um grande órgão endócrino, pois além de ser um depósito energético, o tecido adiposo é também uma fonte produtora de diversos hormônios e citocinas.
     O tecido adiposo subcutâneo é o grande produtor do hormônio da saciedade, chamado leptina. A leptina é um hormônio que, ao ser produzido pelo tecido adiposo subcutâneo, tem como função sinalizar ao hipotálamo que a reserva energética já está bastante (e desta forma, é capaz de inibir o apetite), além de ter a capacidade de aumentar o gasto energético basal e aumentar a lipólise.
     O tecido adiposo visceral, por sua vez, é na verdade um grande tecido inflamatório. Ele é capaz de produzir uma série de proteínas inflamatórias para o corpo, como TNF alfa, IL-6, IL2, Interferon gama. Por este motivo, sabemos que os pacientes com acúmulo de gordura visceral são pessoas que vivem em um estado crônico de inflamação. E esta inflamação é quem vai causar um defeito na sinalização da leptina no seu receptor, caracterizando o que chamamos de resistência à leptina, muito presente na população obesa. A fisiopatologia da resistência a leptina é muito parecida com a fisiopatologia da resistência  a insulina, de forma que muitas vezes ambas andam juntas em um mesmo paciente.
     O paciente com resistência a leptina vai passar a não ter mais saciedade, a fome aumentará mesmo que de forma leve, ocorre uma queda da taxa metabólica basal, e a lipólise não fica mais ativada, causando então um ciclo vicioso que contribui para cada vez maior agravamento da obesidade.
     Além disso, sabemos que pacientes com alimentação gordurosa podem desenvolver resistência à leptina mesmo não havendo um aumento do peso, já que a própria alimentação gordurosa é um fator que leva a um maior ambiente inflamatório dentro do corpo, independente da quantidade de gordura visceral. Isto pode ser explicado, por exemplo, pela diferença entre a flora intestinal de pessoas com alimentação rica em gordura (mesmo magras)  e a flora intestinal de pessoas com alimentação saudável. Sabe-se que a flora intestinal dos pacientes com dieta hiperlipídica é uma flora extremamente pró inflamatória, e causa alterações metabólicas no organismo decorrentes desta inflamação, que podem cursar com a resistência a leptina.
     Para entender melhor um a importância da leptina no funcionamento do corpo, costuma-se estudar uma doença chamada lipodistrofia, que é uma doença genética rara em que a pessoa não possui tecido adiposo subcutâneo algum. Desta forma, a produção de leptina também é nula. Pessoas com esta doença apresentam um fenótipo físico aparentemente mais musculoso, já que não possuem gordura nenhuma encobrindo os músculos. Nestes pacientes, toda a gordura ingerida é estocada sob a forma de gordura visceral.  Desenvolve-se então um quadro de inflamação sistêmica grave, com grande resistência a insulina. Como consequência, pacientes com lipodistrofia apresentam esteatose hepática gravíssima, desenvolvendo ainda na fase infantil a esteatohepatite, evoluindo muitas vezes para a cirrose hepática na vida adulta. É notória a presença clara da hepatomegalia. Invariavelmente desenvolvem diabetes de difícil controle, com necessidade de doses altíssimas e crescentes de insulina para seu tratamento. Como a leptina é ausente, o tratamento com leptina torna-se eficaz neste modelo de pacientes. Com o uso da leptina, estes pacientes passam a comer menos, a gordura no fígado diminui, a lipólise aumenta, e a taxa metabólica basal aumenta. Com auxílio de uma dieta com baixo valor calórico, conseguem com mais eficiência evoluir para a perda de peso, com melhora de todas as taxas metabólicas.
    No entanto, o uso de leptina como tentativa terapêutica da obesidade por excesso de calorias não mostrou o mesmo sucesso. E a explicação para isso é que, nos casos de obesidade exógena, sabe-se que não ocorre falta de leptina (como ocorre nos casos de lipodistrofia), mas pelo contrário, a leptina encontra-se até em excesso, já que sua ação fica prejudicada pela resistência. O problema não é a sua deficiência, mas o defeito da sua ação no seu receptor. Como consequência, ocorre aumento dos níveis séricos de leptina como tentativa de compensação deste defeito.
   A resistência a leptina pode ser comprovada através da dosagem da leptina sérica, que encontra-se bastante aumentada nestas situações. Muitas vezes, pacientes que apresentam resistência à insulina também apresentam resistência à leptina, mesmo que leve, já que a fisiopatologia de ambas é muito parecida.
   Como a  resistência a leptina é consequência dos hábitos alimentares e hábitos de vida, conclui-se que, assim  como no tratamento da esteatose hepática, faz-se necessária uma importante mudança do estilo de vida para melhora deste tipo de situação.



                                                                                        Post por: Mayra Bespalhok

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